quinta-feira, 5 de junho de 2008

CONVITE

A Câmara Municipal da Lousã, a editora Mar da Palavra e o autor, Carlos Carranca, convidam V. Ex.ª a estar presente no lançamento, na Lousã, do livro de poesia "Frátria", em sessão pública a realizar na próxima sexta-feira, dia 6 de Junho de 2008, pelas 21h30, no Auditório do Ecomuseu da Serra da Lousã, Museu Etnográfico Dr. Louzã Henriques.
A apresentação da obra será efectuada pelo Dr. Louzã Henriques, a que se seguirá uma tertúlia de Canto e Guitarra de Coimbra.

:: LIVRO – LANÇAMENTO ::Frátria

PRÉ-FACE

O que a Vida tem de melhor é o facto de ser breve na eternidade que deixamos nos outros. Nela há qualquer coisa que nos escapa, desde o nosso corpo como objecto da nossa representação, até ele se tornar vontade e através dele estarmos em relação com a Natureza. O meu corpo passa a ser a Natureza em mim.
Mas nós somos sempre mais do que conhecemos e os nossos versos vão para além daquilo que sabemos, daquilo que escrevemos.
A vontade (ou a falta dela), como essência de tudo, é a responsável (irresponsável) da nossa miséria, da miséria humana.
A Morte, essa, não está em parte alguma – ela existe na Natureza que se renova.
Toda a palavra sobre a Morte é do domínio do imaginário mas, como todo o imaginário, está cheia de conteúdo da Vida, sobretudo do que da Vida nos escapa. Ela procura uma resposta para a solidão ontológica radical, singular, condenada a sonhar o sonho, que é como quem diz, condenada à inconsistência do sonho.
Pensar na Vida como ela é, é pensá-la com a Morte; é sentir, é sentir-se, é falar de si mesmo, conviver, é entender-se com os outros sem subjugar ninguém nos caminhos da razão.
O que desejamos verdadeiramente? Tocar o coração das coisas ou, como afirmou um dia Unamuno, “nas entranhas do presente buscar a eternidade viva”.
É, pois, trágico, para quem vive em constante procura da essência das coisas, assistir, impotente, à dura realidade de uma Pátria a afastar-se da essência e a perder-se na imitação e na vulgaridade utilitárias. Porque não há nada que mais nos degrade do que esta entrega à idolatria da técnica e do consumismo de massas, onde a preocupação dominante do negócio e a intensidade frenética da Vida aniquilam toda a inquietação espiritual.
Agitar, inquietar, libertar, essa foi, é e será a eterna missão da Poesia.
Interrogo-me, frequentes vezes, se não estará a poesia mais próxima da magia do que da literatura. Ora, o Poeta não é um literato, é um mágico, sendo na dimensão transfiguradora da realidade que o Poeta se cumpre, e não no acervo de obras consultadas ou na profusão de autores citados. Não é citando os criadores que o Poeta existe, é existindo que o Poeta é.
Vivemos num tempo em que os discursos soam a oco. Vivemos num tempo de múltiplas palavras sem sentido, usadas nos comércios diários dos interesses; palavras que são utilizadas e deitadas fora, palavras sem peso específico, sem leveza, em suma, sem valor.
Porque a Poesia passa pelo ritmo encadeado das palavras, e porque ele, o ritmo, assenta na originalidade com que as juntamos ou separamos, é que, ao confrontarmo-nos com a palavra poética, nos reencontramos com a originalidade, com o valor da palavra, com a oração do silêncio – onde nenhum silêncio é já possível, o de alguém que procura a palavra perdida e o seu lugar no homem, o mundo como adjectivo: asseado, purificado, limpo.
Ao entrarmos na obra poética, penetramos na vida que se afasta da razão sem a dispensar, e se aproxima da pura sensibilidade. A Poesia, com as palavras, refaz sentidos, dá-lhes outra coloração, transforma-as sem as deformar.
Há na Poesia uma conciliação da disciplina com a liberdade, ela não mistura poema com ideias, elas estão lá mas são a Poesia. Não cede à facilidade, não transige com a rima, dá-se numa entrega contida, lúcida, solitária. São palavras depuradas pela sua nudez. São palavras recolhidas em si mesmas.
Há na Poesia uma dimensão espiritual, direi mesmo, religiosa, que entra em nós e se recolhe – é a nossa voz que ressoa e nos acorda na transparência da voz do Poeta.
Na ética e na religião, a questão essencial é saber se o homem se redime a si mesmo ou se será redimido por outro; se a sua obrigação é quebrar as suas grilhetas ou, agrilhoado, ir quebrar as grilhetas alheias.
A Poesia tenta, pela palavra, libertar-nos do ruído que aprisiona e, em função do outro, libertá-lo, religando-o à palavra perdida no aperfeiçoamento do mundo.
No princípio era o Verbo.
Todas as coisas foram feitas pela palavra, a palavra desocultadora do mundo, da Vida, da beleza.
Sabemos que a Morte é a mentira e a verdade é a Vida, mas também sabemos que a única verdade objectiva é a Morte, porque a Vida é um conjunto de mentiras que nos serve de consolo; mas o Poeta sabe, também, que a palavra vence a Morte e que é a palavra poética a mais humana das obras.

Carlos Carranca

AUTOR
CARLOS CARRANCA – Nasceu na Figueira da Foz e mantém forte ligação com a Lousã. É professor do ensino superior, poeta, ensaísta, declamador, cantor e animador cultural. Licenciado em História, é professor auxiliar convidado da Universidade Lusófona, docente da Escola Superior de Educação Almeida Garrett e da Escola Profissional de Teatro de Cascais. Foi presidente da Direcção da Sociedade de Língua Portuguesa e fundador e elemento da Direcção do Círculo Cultural Miguel Torga, bem como sócio fundador da Sociedade Africanóloga de Língua Portuguesa. Integra o Centro de Estudos de História Contemporânea e fundou o Centro de Iniciação Teatral, juntamente com Carlos Avilez e João Vasco.
Estudioso das tradições populares e académicas de Coimbra, é como poeta que se torna conhecido, com três livros ligados à temática coimbrã: “Serenata Nuclear”, “7 Poemas para Carlos Paredes” e “Coimbra à Guitarra”. É, porém, como divulgador da poesia portuguesa, enquanto poeta e ensaísta (torguiano convicto) e na qualidade de animador cultural, que o seu trabalho ganha importância. Em Junho de 2001, recebeu a Medalha de Mérito Cultural do Município de Cascais.

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